segunda-feira, 13 de julho de 2009

Fiquei ali, no balcão, enchendo a cara com Keep Cooler. Esperei alguém vir. Esperei alguém convidar. Esperei alguém notar. Gôsto de bebida de motel, pensei. Ninguém notou, ninguém parou. Não seria romântico se alguém parasse, se dissesse alguma coisa.
As borbolhas queimando o céu da boca, prendendo gás pra dentro da garganta. Eu, vestida de preto, como minha alma.
Pegaram na minha bunda no banheiro.
Todas as minhas curvas se tremeram de nojo e vontade de me entregar a um abismo sem fim, sem volta, como quem se corta pra se punir ou sentir prazer.
Encheream a mão em direção ao meu sexo.
Tive medo. Lembrei da minha mãe e de um anjo que colocaram em meu caminho pra me assustar e me dizer o óbvio. Maria Paulina, com Gudang Garam de prontidão.
Saí deslizando pelas paredes pintadas de esmalte-escola-estadual. Minhas unhas carregando resíduos. Cheguei à calçada e vomitei. A vontade era de vomitar tudo, pra fora de tudo, olhos, nariz, orelha. Ali mesmo chorei a gosma inteira, tudo que é molhado nessas situações.
No táxi, ainda com medo, encostava de pescoço mole a cabeça no banco, tentava, sem muito esforço, esconder um pouco das pernas com o pouco pedaço de saia. Desço um quarteirão antes pra sentir o frio da rua de novo, misturar o negro de dentro com cor de noite que me engolia. Me encostei na árvore e chorei lágrimas quentes, derretidas, como se saíssem direto do peito. A casca antiga da árvore, benzida de fumaça, poluição e história, me dava um aconchego frágil, uma sensação reflexa de um acalanto que eu fornecia a um ser esquecido.
Se eu subisse agora as escadas branco-encardidas em espiral, sei que seria longo o caminho, não querendo me ver sozinha sem espreita na rua, e nem em casa, onde, nem o quadro pendurado na parede – a que eu tinha paixão – me faria preencher os espaços de pé direito e lençol esticado (pra quem eu ainda fazia a cama?). Quisesse, talvez, colocar aquele disco ao vivo da Nina Simone, um Martini no copo, pra mudar o gosto da boca, um pijama comprido, pra me sentir comum, as janelas do apartamento da frente com o casal de idosos que dançavam tango devagarzinho. Se eu entrasse, se desse boa noite de cabeça baixa ao seu porteiro. Se conseguisse subir as escadas. Se abrisse a porta, pisasse o quinto taco solto. Talvez a gata estivesse em casa. E eu olhando as pedras portuguesas debaixo do salto. Se eu entrasse e subisse as escadas. Se eu subisse. Se eu entrasse. A casca da árvore. A pedra portuguesa.

4 comentários:

kassiaindia disse...

Eu sei, EU TE AMO.

Lua disse...

ja assistiu carne crua?

Maíra Selva disse...

nao, mas ontem assisti carne trêmula...

Anônimo disse...

De quem é o texto?
Seja de quem for... não importa. Bendita seja!
Foi escrito pela alma desnuda de alguém vestida de preto.
Que essa alma, benzida com suas lágrimas quentes e salgadas, nascidas do peito, suba as escadas, entre pela porta, desperte o ser esquecido e encontre o aconchego.
Na ausência de uma palavra mais adequada.... lindo o texto.
Obrigada por compartilhar,

Marina.