quarta-feira, 30 de junho de 2010

26

Sua cicatriz que me faz companhia, onde passo a mão, percebo uma pequena depressão, sei da estória, mas, agora, só me bastava ela em si. Só me bastava o que ela de vivo lembra em você.
Seus braços com veias e textura e cheiro e temperatura. Os dois.
Ombros por uma blusa que mostra mais um do que o outro. Ombros de outra época, ombros como prolongação de braços e vice versa. Ombros pra deitar a cabeça e afastar os cabelos, os seus.
Olhos e cílios que se mostram e piscam como numa fotografia. Olhos de água. E sobrancelhas, crescem e diminuem e gesticulam junto com as coisas que quer demonstrar.
Bochechas.
Pés. Pés que se enterram e enfiam no chão e pairam e te locomovem do seu jeito, do jeito que te reconheço à distância.
Cabelos que cheiram e mudam de textura e penteado e te dão uma preocupação que, mesmo que desnecessária, é o reflexo de um interagir-se consigo.
Pescoço e cheiro que sai e orelhas.
Joelhos e pernas prontos e certos.
Mãos, mãos, mãos. E unhas. Mãos. Resumo de tanto que poderiam existir sozinhas. No escuro, só elas. Longas o bastante. Retas. Mãos.
Tudo isso seria muito, muito. Mas, pelo menos a cicatriz. Só a cicatriz, eterna cicatriz.
Dentro do trem e agora, nada mais. Sua cicatriz.

Um comentário:

Raquel Beatriz disse...

mais um ensaio...

lindo!